quinta-feira, 8 de abril de 2010

Um breve olhar na relação entre educação e trabalho nos dias atuais

Introdução

A realidade da Educação nacional é marcada por um ranço histórico de todas as propostas formuladas e reformuladas desde a Era Pombal, quando o Estado assumiu a centralidade do processo educacional. De lá pra cá, sempre visando à importância da educação para o desenvolvimento nacional, vem surgindo políticas educacionais voltadas para o contexto social do momento, seja na época da industrialização, seja no período militar, seja na época da globalização.

O fato é que, a formação para o trabalho desde os tempos históricos é uma marca, a política dual entre a escola para a elite e a escola de natureza profissional para a classe operária aparece até hoje em alguns contextos, ainda que não declarados como tal.

Sendo assim, algumas políticas tentam reverter o quadro desigual em que se apresenta a educação nacional, e desde a criação da LDB e do PNE, algumas estratégias vêm sendo formuladas no intuito de elevar o índice de escolaridade do povo, melhorar a qualidade do ensino, de facilitar o acesso e a permanência na escola, expandir as vagas no ensino superior, etc., enfim, de planejar a educação brasileira em longo prazo.

No contexto atual da economia mundial, globalizada, toda a questão da educação ganhou um enorme foco, e a Teoria do Capital Humano, cujo ideário residia na relação de proporção entre escolaridade e renda ganhou força. O capital humano era considerado como um estoque de habilidades, atitudes e valores e de saúde do trabalhador, aliado às metas, objetivos, missão e cultura da empresa.

O processo neoliberal impôs aos países, principalmente aqueles em desenvolvimento, valores baseados no mercado, subjugando os valores humanos e nacionais e prevalecendo o interesse particular em muitos casos. Onde vemos fatores como desregulamentação, descentralização, autonomia e privatização, a escola tida como serviço e não como direito entre muitas outras coisas que afetam diretamente a política, a economia e a educação brasileira.

A educação, o trabalho e o homem

Se partirmos do princípio da conceituação básica, que se faz política para satisfazer as necessidades de uma sociedade, e de que objetivos são os alvos estabelecidos para alcançar determinado fim, pode-se dizer que existe um objetivo permanente para a educação no Rio de Janeiro, que, permeado pelos parâmetros nacionais tem que cumprir a parte que lhe cabe enquanto estado, até porque recebe recursos para tal fim. Por outro lado, não só o RJ como qualquer outro estado tem que ter comprometimento com a população, pensando de fato no seu bem-estar econômico, educacional e social. Freire (1987), já pontuava que, no tocante à educação, a palavra ajuda o homem a tornar-se homem, a pensar o mundo, julgá-lo e expressar juízos, e comentava:

“Pretender a libertação deles sem a sua reflexão no ato desta libertação é transformá-los em objeto que se devesse salvar de um incêndio. É fazê-los cair no engodo populista e transformá-los em massa de manobra”. (p. 52)

Ou seja, qualquer que seja a política aplicada deveria estar atenta às necessidades do povo, a escola deveria ser de formação geral, humana, e desinteressada, como dizia Gramsci, mas na prática, em função dos tão convincentes discursos neoliberais, a escola acaba por tomar outros rumos.

“A pedagogia do oprimido (...) se apresenta como pedagogia do homem. Somente ela, que se anima de generosidade autêntica, humanista e não humanitária, pode alcançar esse objetivo. Pelo contrário, a pedagogia que, partindo dos interesses egoístas dos opressores, egoísmo camuflado de falsa generosidade, faz dos oprimidos objetos de seu humanitarismo (...). É instrumento de desumanização”. (p. 41)

O populismo cria uma escola unitária aparente, o mundo do trabalho e da escola se aproximam,mas não se integram, como cita Nosella, “dirigentes e dirigidos continuam em escolas diferentes, mesmo recebendo diplomas “iguais”.

É através do trabalho que o homem se transforma e transforma o mundo, e, como traz Freire (1987), é como seres transformadores e criadores que eles produzem não somente bens materiais, mas as instituições sociais, as idéias e concepções. O que ocorre é que com as transformações que sofreram a educação, a economia e o mundo em geral a partir do estabelecimento do novo padrão de acumulação de capital, as relações entre educação e trabalho tornaram-se intrínsecas e o homem teve que se adaptar a essa “volatilidade” do conhecimento nessa nova era de tecnologias.

O autor reafirma então que “os homens seres da práxis” e quando, porém, por um motivo qualquer se sentem proibidos de atuar, quando se sentem incapazes de usar suas faculdades, sofrem.

Então, as políticas recomendadas inclusive pelos organismos financeiros internacionais são de conformar essa massa, ajudam, colaboram e inculcam seus ideais, ou, como critica Freire, fazem os dominadores aparecerem como salvadores dos homens a quem desumanizam, mas no fundo querem salvar-se a si, sua riqueza, poder e estilo de vida com que esmagam os demais. Para a elite dominante, é fundamental que os oprimidos se convençam de que estão sendo defendidos.

E com o discurso de levar em conta o retrato da situação dos grandes excluídos nesse massacrante processo de globalização da economia, alguns projetos vem sendo traçados para que o trabalhador possa ser valorizado e suas competências possam ser reconhecidas.

A certificação por competências

Segundo a LDB, uma pessoa não aprende apenas no âmbito da escola ou na educação formal, na formação humana, incontestavelmente se aprende no cotidiano em função da família, do ambiente, das instituições de ensino, dos movimentos culturais e do trabalho, que é por essência um princípio educativo.

Assim, foram criados instrumentos legais para o reconhecimento das competências fora do âmbito da educação formal. Existem ainda algumas discussões a respeito dessa certificação pessoal, os critérios, procedimentos e etc., e os estados vão definir seus parâmetros em parceria com o ministério do trabalho e outras organizações das suas áreas, por se tratar de educação básica.

O objetivo é de certificar o que ele aprendeu fora da escola, valorizar a sua competência, e também estimulá-lo a se qualificar mais, que pode ser vantajoso no sentido de dar oportunidade àqueles que realmente dominam uma determinada técnica, mas que por alguma razão não puderam freqüentar o ensino formal, mas ao mesmo tempo pode ser desvantajoso e perigoso colocar mais mão-de-obra certificada no mercado, aumentando a oferta e deixando a “mão invisível” agir, pois a nossa sociedade ainda é muito desigual e nesse sentido essa meritocracia pode ser danosa. O trabalhador cada vez mais é responsabilizado pela formação que não tem, pois o Estado mínimo não dá, ou pelo emprego que não consegue, pois a economia também pode não comportar.

Seja como for articulada, essa proposta, tem que ser forjada, como cita Freire, “com ele e não para ele”. Levando em conta a realidade, o modo de vida e as condições desse trabalhador. Não se pode aceitar que todo esse esforço seja manobrado em prol do capital, certificando mão-de-obra somente para atender a seus interesses.

“Os oprimidos, os objetos, como quase coisas, não tem finalidades, as suas, são as finalidades que lhes prescrevem os opressores”. (p.47)

No caso do artigo publicado comentando o projeto piloto em Brasília, está explícito que esta iniciativa para trabalhadores na área de sondagem de solo “a formatação dos cursos e dos exames de avaliação levará em conta as necessidades e exigências do mercado imobiliário do Distrito Federal”.

Então essa tão propalada certificação é para beneficiar quem afinal?

Conclusão

Qualquer política que se trace se tratando ou não de objetivos nacionais ou permanentes seja no Rio de Janeiro ou em qualquer outra localidade deve objetivar a coletividade, pois são aos anseios da sociedade que a política deve atender. Sempre levar em conta o homem como ser integral e não somente como trabalhador e no tocante a educação oferecer um programa que não divida, que não distinga ricos e pobres, elite e proletariado, opressores e oprimidos. Espera-se que não se propague mais a educação dual, elitista, servindo somente aos interesses de uns, dando oportunidades desiguais e conseqüentemente destinos diferentes aos sujeitos do processo.

Segundo Freire (1987), a manipulação se faz por toda a série de mitos, anestesiando as massas para que não pensem. A força de coerção do estado, conforme Gramsci comentou, aparece sempre no convencimento e no consenso. Quem discorda de que é bom para o trabalhador excluído, ou como trata Freire, marginalizado, “fora de” ou “a margem de”, que a solução para eles estaria em serem integrados incorporados à sociedade de onde um dia partiram?

Com esse discurso neoliberal envolvente, que desmerece nossa escola, que desmonta o Estado, que atende todas as recomendações do Banco Mundial, as relações que permeiam educação e trabalho tendem a se voltar cada vez mais para formar mão-de-obra e não cidadãos. Tendem à falácia de que por ser a educação o fator preponderante para o desenvolvimento da nação ela tem que ser voltada para atender as necessidades do Capital. Tendem a crer que as empresas são as mais capazes de gerir o sistema educacional, pois são os “compradores dessa mão-de-obra” e como tal querem exigir a qualidade do “produto” que estão adquirindo. Desumanização.

Referências:

FREIRE. Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979.

NOSELLA, Paolo. In NEY. Antonio. Políticas Educacionais. Caderno de Estudo. Rio de Janeiro, 2010.

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